Zirma
Foi em dezembro, no mês bendito, No mês de festa, que ela partiu...
Desde esse tempo, do seu seio aflito Minh’alma louca, também fugiu.
E foi tão grande minha agonia Que quase morro de soluçar, Quando beijei-a na boca fria Como uma concha que sai do Mar!
Passava a noite...( lembro-me tanto!)
Noite de lua, misteriosa...
Choravam astros no etéreo manto...
Meu Deus, que noite silenciosa!
A lua mansa no Céu vogava, Como um barquinho n’agua do rio, E parecia que murmurava:
“No Céu formoso faz tanto frio!”
No esquife azuleo, feito a capricho, Por entre rosas de alvura tanta, Deitaram Zirma como no nicho Guarda-se a imagem de alguma Santa.
O rosto branco da cor de gelo Um doce lírio trazia á mente...
Na noite escura de seu cabelo, Nem um só astro resplandecente!
Ninguém diria que estava morta O lábio aberto por um sorriso, Na terra triste, - que desconforto!
Quanta alegria - No Paraíso!
Qual uma virgem, pura e singela, Que deixa o mundo para ser freira, Toda de branco, tinha a capela Feita de flores de laranjeira.
Por sobre o manto, formosa e leve, Muito estrelado, de azul cetim, Das mãos pequenas da cor da neve Pendia o terço cor de marfim.
Subiu-me aos olhos, em doudo assomo, O amargo pranto do coração, Vendo-a tão linda, vestida como Nossa Senhora da Conceição.
Os olhos negros eram dois círios Que se extinguiram no pé do altar...
Aqueles olhos, meus dois martírios, Quem contemplava sem soluçar!
Ó pobre Zirma, nívea açucena, Camélia branca murchada na haste:
Por que fugiste da vida amena?
Por que tão cedo me abandonaste?
Eu precisava de teu carinho Como de orvalho precisa a flor, E embalde busco no meu caminho O amparo doce de teu amor.
Anjo da guarda, formoso e santo, Que me escondias nas tuas asas, Quem é que agora me enxuga o pranto, Cilício eterno na face em brasas!
Sem estes olhos que a morte cerra, Sem o consolo de teu sorriso, Como é que posso viver na terra, Ó minha santa do Paraíso!
Nova Cruz - 1897