O segredo
"Agora vou dizer-te por que morro;
Mas hás de jurar primeiro, Que jamais tuas mãos inocentes Ferirão meu algoz derradeiro...
Meu filho, eu fui a vítima Da raiva e do ciúme.
Matou-me como um tigre carniceiro, Bem vês, Uma branca mulher, que em si resume Do tigre — a malvadez, Do cascavel — o rancor!...
Deixo-te, pois...
— Um grito de vingança?
— Não, pobre criança! ...
Um crime a perdoar... o que é melhor!...
"Depois. teve razão... Esta mulher É tua e minha senhora!...
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
"Lucas, silêncio! que por ela implora Teu pai... e teu irmão! ...
"Teu irmão, que é seu filho... (ó magoa e dor!)
"Teu pai — que é seu marido... e teu senhor! ...
"Juras não me vingar? — ó mãe, eu juro Por ti, pelos beijos teus!
"— Obrigada! agora... agora Já nada mais me demora...
Deus! — recebe a pecadora!
Filho! — recebe este adeus!"
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Quando, rompendo as barras do oriente, A estrela da manhã mais desmaiava, E o vento da floresta ao céu levava O canto jovial do bem-te-vi;
Na casinha de palha uma criança, Da defunta abraçando o corpo frio, Murmurava chorando em desvario:
— Eu não me vingo, ó mãe... juro por ti!..."
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Maria calou-se... Na fronte do Escravo Suor de agonia gelado passou;
Com riso convulso murmura: "Que importa Se o filho da escrava na campa jurou?!...
"Que tem o passado com o crime de agora?
Que tem a vingança, que tem com o perdão?"
E como arrancando do crânio uma idéia Na fronte corria-lhe a gélida mão...
"Esquece o passado! Que morra no olvido...
Ou antes relembra-o cruento, feroz!
Legenda de lodo, de horror e de crimes E gritos de vítima e risos de algoz!
"No frio da cova que jaz na explanada, — Vingança — murmuram os ossos dos meus!"
— Não ouves um canto, que passa nos ares?
— Perdoa! — respondem as almas nos céus!"
— "São longos gemidos do seio materno Lembrando essa noite de horror e traição!"
— "É o flébil suspiro do vento, que outrora Bebera nos lábios da morta o perdão!..."
E descaiu profundo Em longo meditar...
Após sombrio e fero Viram-no murmurar:
"Mãe! Na região longínqua Onde tua alma vive, Sabes que eu nunca tive Um pensamento vil.
Sabes que esta alma livre Por ti curvou-se escrava;
E devorou a bava...
E tigre — foi reptil!
"Nem um tremor correra-me A face fustigada!
Beijei a mão armada Com o ferro que a feriu...
Filho, de um pai misérrimo Fui o fiel rafeiro...
Caim, irmão traiçoeiro!
Feriste... e Abel sorriu!
"De tanto horror o cúmulo, Ó mãe, alma celeste Se perdoar quiseste, Eu perdoei também.
Santificaste os míseros;
Curvei-me reverente A eles tão-somente, Somente... a mais ninguém!
"Ninguém! que a nada humilho-me Na terra, nem no espaço!...
Pode ferir meu braço...
— "Lucas! não pode, não!
Mísero a mão que abrira De tua mãe a cova...
O golpe hoje renova!...
Mata-me!... É teu irmão!..."
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