Não tenho pressa: não a têm o sol e a lua
Escrito em 20-6-1929 Não tenho pressa: não a têm o sol e a lua.
Ninguém anda mais depressa do que as pernas que tem.
Se onde quero estar é longe, não estou lá num momento.
Sim: existo dentro do meu corpo.
Não trago o sol nem a lua na algibeira.
Não quero conquistar mundos porque dormi mal, Nem almoçar o mundo por causa do estômago.
Indiferente?
Não: filho da terra, que se der um salto, está em falso, Um momento no ar que não é para nós, E só contente quando os pés lhe batem outra vez na terra, Traz! na realidade que não falta!
Não tenho pressa. Pressa de quê?
Não têm pressa o sol e a lua: estão certos.
Ter pressa é crer que a gente passe adiante das pernas, Ou que, dando um pulo, salte por cima da sombra.
Não; não tenho pressa.
Se estendo o braço, chego exactamente aonde o meu braço chega (
Nem um centímetro mais longe.
Toco só aonde toco, não aonde penso.
Só me posso sentar aonde estou.
E isto faz rir como todas as verdades absolutamente verdadeiras, Mas o que faz rir a valer é que nós pensamos sempre noutra coisa, E somos vadios do nosso corpo.
E estamos sempre fora dele porque estamos aqui.