Flor do Campo
A meu irmão Eloy
Moça ingênua e formosa, Ó doce filha do sertão agreste!
O teu olhar celeste Tem o fulgor da Noite luminosa.
Guarda a mesma doçura, O mesmo encanto feito de esperanças Dos olhos das crianças, Ninho de sonho e ninho de ternura.
A luz do Paraíso, Quando a alegria tua boca enflora, Resplende como a aurora Na graça virginal de um teu sorriso.
É’s inocente e boa Como a Quimera que em teu seio canta Tens a beleza santa Da pomba amiga que no Espaço voa.
Jamais alguém te disse Que tens o rosto branco como o gelo, A noite no cabelo E o sorriso tão cheio de meiguice.
Por isso inda é mais bela A tua fronte cândida e tranqüila, E o fogo que cintila No teu olhar é como o de uma estrela.
Angélica e suave, É tua voz que as almas adormece, Um ciciar de prece, Embalando a saudade de algum’ave.
Hoje tu’alma ignora Toda a magia deste rosto puro;
Mas, olha, no futuro Lembrar-te-ás do que não vês agora.
E, então, com que saudade Recordarás esse passado morto Em triste desconforto, Chorando os sonhos da primeira idade.
Ó lindo malmequer, Anjo que vives a sonhar com Deus...
Põe os olhos nos meus E ouve bem séria o que te vou dizer:
Um dia, talvez cedo, Teu coração palpitará inquieto E, transbordando afeto, Há de afagar um íntimo segredo.
Para tu’alma honesta O Céu inteiro, iluminado, ó flor!
Com a luz de um puro amor Há de brilhar como uma Igreja em festa.
E assim, risonha e calma, Conduzirá ao porto da aliança, Na barca da Esperança, Como um troféu, o noivo de tu’alma.
E Deus há de baixar Sobre estas duas mãos que o padre estreita, A bênção mais perfeita, O seu mais doce e mais divino olhar.
Feliz, muito feliz, A tua vida correrá de manso No plácido remanso De quem adora o Céu e o Céu bem-diz.
Depois, do Paraíso, Jesus há de enviar-te uma filhinha, Formosa criancinha Que embalarás cantando n’um sorriso.
E ela há de ser bonita E boa como tu, anjo terrestre, Ó linda flor silvestre, Minha singela e casta margarida!
E após anos e anos, Quando ela ficar moça e no teu rosto A sombra do sol posto For desdobrando o manto dos enganos.
N’um dia de verão, Sentado à porta, à hora do descanso, Sorrindo, bem de manso, Há de dizer, pegando-te na mão.
O velho esposo amigo:
- Repara como é linda a nossa filha!
Seu riso como brilha!
Eras assim quando casei contigo.
E tu hás de evocar, Entre saudades trêmulas e ais, Aquele tempo que não volta mais!
E no gracioso olhar De tua filha os olhos mergulhando, Deixarás a tu’alma ir flutuando Sobre a onda bendita Daquele mar puríssimo e dolente...
E, então, murmurarás saudosamente:
Ah! como fui bonita!
Alto da Saudade.