Dadá
Dadá tinha um filhinho muito louro, Tão louro como um raio de luar.
Aquela criancinha era o tesouro, O imaculado encanto do seu lar.
Dadá o amava tanto que no mundo Su’alma em cousa alguma achava brilho.
Nada alterava aquele amor profundo:
Só via o berço onde sonhava o filho.
Quanto cuidado e que afeição tão santa!
A areia onde brincando ele corria, Se ela pudesse (ah! se não fosse tanta!)
Mesmo dentro do seio a guardaria.
Desejava que a terra fosse um ninho Habitado por ela e os seus amores;
Queria mais que o buliçoso anjinho Só visse o céu e só pisasse em flores.
Pois se ele era o sorriso de seus olhos Desde que o esposo para o Além se fora!
Se era a luz que surgia entre os abrolhos De su’alma tristonha e sofredora!
Sorrindo a mãe dizia olhando a terra E o casto manto azul de lá do céu:
“Sois muito lindo, mas nenhum encerra Jóia mais linda do que o filho meu.”
E tinha bem razão. O seu Laurinho, Aquela criatura tão franzina, Guardava lírios brancos no rostinho E uma rosa na boca pequenina.
Não consentia que ele um só minuto Dos cuidados maternos se afastasse:
Era um contraste a sombra de seu luto Na alvura virginal d’aquela face!
E se às vezes a garrula criança Disparava a correr jardim a fora.
Dadá pensava que sua esperança Ia fugindo ou que morria a aurora...
Então cismava cheia de receio, Como se o seu filhinho mais não visse:
E se alcançava, comprimia-o ao seio, Temerosa que ainda lhe fugisse..
Se ele morresse, o que seria d’ela?
Dadá cuidava às vezes tristemente -
Se essa criança era como a estrela Que guiava os Reis Magos no Oriente?
E entre esperanças e temores francos, Lauro crescia cada vez mais lindo;
Quando falava, os seus dentinhos brancos Lembravam à gente um bogari abrindo.
Um dia, ao acordar, Lauro queixou-se De que o corpinho todo lhe doía.
A mãe cercou-o de um carinho doce:
O seu filhinho de que sofreria?
E ele chorava que fazia pena Naquela alegre e límpida manhã, Pálida a face como uma açucena, E o róseo lábio a murmurar: “mamã”!
Dadá beijava aquela mão querida E os pés e o rosto e o peito nu e a boca:
Queria ver se lhe incutia a vida Naqueles beijos que lhe dava, louca!
O triste pobrezinho soluçava Entre as carícias do materno afago;
E, em seus olhos, a morte esvoaçava Bem como um corvo à tona azul de um lago.
Antes do sol pender sobre o horizonte O querubim cessava de existir;
E alguém ainda lhe beijava a fronte:
Era Dadá a soluçar e a rir.
Estava louca. D’ora em diante, a vida, Quem lhe traria ao ninho seu deserto?
Lauro morrera... Branca flor pendida Caíra murcha num esquife aberto!
Ela bem vira quando carregavam O meigo arcanjo dentro de um caixão...
Almas cruéis! Do seio lh’o arrancaram E com ele também seu coração!
Há muitos anos que isto sucedeu, Mas, entretanto, o que da morte a salva É que Dadá, quando contempla o céu, Diz que seu filho está na estrela d’Alva.